terça-feira, 22 de outubro de 2019
quinta-feira, 3 de outubro de 2019
NAU CATRINETA - painéis de Almada Negreiros

Os frescos da gare
(8 painéis - dois trípticos e duas composições isoladas) são da autoria de Almada Negreiros (artista português
multifacetado).
PAINEL 1 – Apresenta uma nau, com os
marinheiros à mesa e os pratos vazios. Como sabem, eles deitaram sortes para
ver quem matariam, a fim de terem de comer. E logo a sorte foi cair no capitão
que pede a um marujo, que suba ao mastro, para ver se via terra, numa tentativa
de escapar da morte.
PAINEL 2 - Entretanto o gajeiro (marinheiro
encarregado de subir aos mastros) terá sido possuído pelo demónio, e pede
alvíssaras (recompensas) ao capitão. Este oferece-lhe sucessivamente, a mais
formosa das suas três filhas, muito dinheiro, o seu cavalo branco e a Nau Catrineta,
mas tudo ele recusa, dizendo que quer a alma do capitão. O capitão renega-o
dizendo que a sua alma é só de Deus, e que antes dá o corpo ao mar. Nesta
pintura se pode ver a nau, as três meninas e o cavalo.
PAINEL 3 - Vencido o demónio pela fé do
capitão, eis que chegam a terra. Esta pintura mostra a chegada a terra. Reparem
que apesar desta lenda ser relativa aos Descobrimentos, o pintor usou para
"vestir" as pessoas, roupas da época - anos 40.
NAU
CATRINETA
Lá
vem a Nau Catrineta,
que
tem muito que contar!
Ouvide,
agora, senhores,
Uma
história de pasmar."
Passava
mais de ano e dia,
que
iam na volta do mar.
Já não tinham que comer,
nem tão pouco que manjar.
Já
mataram o seu galo,
que
tinham para cantar.
Já
mataram o seu cão,
que
tinham para ladrar."
"Já
não tinham que comer,
nem
tão pouco que manjar.
Deitaram
sola de molho,
para
o outro dia jantar.
Mas
a sola era tão rija,
que
a não puderam tragar."
"Deitaram sortes ao fundo,
qual se havia de matar.
Logo a sorte foi cair
no capitão general"
-
"Sobe, sobe, marujinho,
àquele
mastro real,
vê
se vês terras de Espanha,
ou
praias de Portugal."
-
"Não vejo terras de Espanha,
nem
praias de Portugal.
Vejo
sete espadas nuas,
que
estão para te matar."
-
"Acima, acima, gajeiro,
acima ao tope real!
Olha
se vês minhas terras,
ou
reinos de Portugal."
-
"Alvíssaras, senhor alvissaras,
meu
capitão general!
Que
eu já vejo tuas terras,
e
reinos de Portugal.
Se
não nos faltar o vento,
a
terra iremos jantar.
Lá
vejo muitas ribeiras,
lavadeiras
a lavar;
vejo
muito forno aceso,
padeiras
a padejar,
e
vejo muitos açougues,
carniceiros
a matar.
Também vejo três meninas,
debaixo de um laranjal.
Uma
sentada a coser,
outra
na roca a fiar,
A
mais formosa de todas,
está
no meio a chorar."
-
"Todas três são minhas filhas,
Oh!
quem mas dera abraçar!
A
mais formosa de todas
Contigo
a hei-de casar"
-
"A vossa filha não quero,
Que
vos custou a criar.
Que
eu tenho mulher em França,
filhinhos
de sustentar.
Quero a Nau Catrineta,
para nela navegar."
-
"A Nau Catrineta, amigo,
eu
não te posso dar;
assim
que chegar a terra,
logo
ela vai a queimar.
-
"Dou-te o meu cavalo branco,
Que
nunca houve outro igual."
-
"Guardai o vosso cavalo,
Que
vos custou a ensinar."
-
"Dar-te-ei tanto dinheiro
Que
o não possas contar"
-
"Não quero o vosso dinheiro
Pois
vos custou a ganhar.
Quero
a Nau Catrineta,
para
nela navegar.
Que assim como escapou desta,
doutra ainda há-de escapar"
Lá
vai a Nau Catrineta,
leva
muito que contar.
Estava a noite a cair,
e ela em terra a varar.

O poema narra as desventuras dos tripulantes durante a longa
travessia marítima - os mantimentos que esgotaram, a presença de tentação
diabólica e afinal, a intervenção divina, que leva a nau a seu destino.
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